domingo, 10 de janeiro de 2010

A Fortuna é uma deusa que cobra caro seus favores.


Fortuna, ambígua e traiçoeira, derramando seus favores


Quando a França perdeu a Guerra dos Sete Anos, marquesa Pompadour era a amante do rei e uma das principais articuladoras políticas da França, sendo ela tida como a grande responsável por levar o país ao conflito armado contra a Inglaterra e Prússia.

De um dia para o outro, sua sorte modificou-se. De mulher requisitada nas decisões do Estado, passou ao segundo plano. De liderança política destacada, passou a ser mera sombra vagante em Versalhes. De influente, passou a ser ignorada. De senhora da alcova real, passou dela a ser repelida, pois em seus dias áureos de beleza se foram, e com eles, a influência política junto ao monarca. Por isso, com razão, disse Pompadour que a Fortuna é uma deusa que cobra caro seus favores.

A nossa vida cotidiana demonstra a veracidade de tal frase regularmente.
Quantas pessoas que, em um dia estão sendo abençoadas com todas as glorias terrenas, com tudo o que pode ser concedido a alguém, pra no outro dia, sem aviso, cruelmente e tão rápido quanto uma fagulha se acende e apaga, cair essas pessoas.

Quando estamos inebriados de um sentimento ou de uma posição, seja esse sentimento o amor, a glória, a honra, a paixão, ou essa posição seja a riqueza, a de um status elevado, mais tem prazer a vida de ministrar o desfacelamento de tal pessoa. Ao homem não é dado ter constante tranquilidade, despreocupação e paz. Toda a vez que o faz, em vez de estar se encaminhando para um porto seguro de paz e prazer, encaminha sua nau, inadvertidamente, para caminhos tortuosos e mares tempestuosos, e seu navio está mais perto do naufrágio do que se pode imaginar.

De uma mão a Fortuna fornece todas as honras e glórias, jorra todas as maravilhas da Terra, todos os sonhos ditosos são realizados. Mas tal realização não faz mais do que deixar os homens frouxos e incautos, seguros de si e crentes na perenidade de sua posição. Mas após entorpecer espírito humano com lisonjas e favores, a mão beneficente para de derramar o doce mel de prodigalidades, e a outra mão retira todos os benefícios outrora concedidos, tão rápido como uma piscadela de olho, o homem, outrora elevado, se vê rebaixado a um grau mais baixo do que os mendicantes.
Ao menos, a maior parte desses últimos não conheceram os favores da Fortuna, e menos doloroso é tal posição dos que jamais deixaram a escuridão da caverna do que aqueles que conhecem a luz e a vastidão do lado de fora, ter que se contentar com a escuridão, as frias e estreitas paredes de pedra da caverna. Um verdadeiro ser humano, com sentimento de ser humano, que conheceu a luz, jamais conseguirá se contentar com as trevas. Não há tragédia humana mais pungente do que a patética, mas ao mesmo tempo gloriosa busca daquele que, desvalido dos favores da Fortuna, luta para aos seus pés novamente receber o quinhão que se acha merecedor.

Como um ferro que para ser moldável e receber a martelada que vai modificar para sempre seu formato, passa pela forja afim de que o calor possibilite tal transformação, assim somos nós nas mãos da Fortuna, com sua forja nos amolece e com sua martelada nos fustiga.

A Fortuna nos faz lembrar o quão mortais somos, o quão incerto são nossos dias e nossas vidas. Ela nos mostra que a despreocupação, o riso, a alegria e o amor também tem seu preço nefasto, por detrás da felicidade aparente, muitas vezes está se formando uma tempestade inaudita, que leva os homens consigo e não raro os destrói, tornando-os meras caricaturas do que foram, ou enrijecendo seus espíritos de uma maneira inédita.

Nenhum sentimento, nenhuma afeição, nenhuma posição são eternas, aliás, tal palavra foi criada apenas para enganar os desavisados e os tornar fracos a ponto de se deixarem manipular e baixar sua guarda, para que sua alma e coração sejam usados e manipulados de acordo com a diretriz de uma vontade alheia, e quando o doce sabor do devaneio cessa, tarde demais vê-se o quanto foi ludibriado por suas próprias ilusões, e elas, de doce, tornam-se uma jaula de onde o sonhador não quer escapar.

Para finalizar esse ode à Fortuna, vejam esses dois videos com quais encerro minha divagação:


Karl Orff: O Fortuna


Nami Tamaki: Fortune (Radiata Mix)

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